Mindfulness pode ajudar pessoas com depressão? Sim, veja como

mai. 04, 2018

 Assim como sentir ansiedade faz parte da vida de qualquer pessoa, ter períodos de tristeza é normal e esperado durante o curso natural da vida. Em especial, em situações de perdas, como morte de uma pessoa querida, por exemplo; desapontamentos ou isolamento social. A tristeza, nesses momentos, apesar do grande desconforto emocional, acaba sendo uma experiência útil e necessária, porque convida à reflexão e permite o reajuste a novas condições de vida.

O problema acontece nos quadros extremos de tristeza, que chamamos de depressão. A depressão é um diagnóstico médico, amplo e heterogêneo, caracterizado por humor deprimido e perda de prazer na maioria das atividades do dia a dia, e grande comprometimento da saúde física e bem-estar, podendo, inclusive, ser fatal, em casos de suicídios.

Estudos mostram que, no Brasil, aproximadamente 6% das pessoas terão um diagnóstico de depressão no período de um ano –o que corresponde a um número grande de pessoas, em torno de 12 milhões. A OMS (Organização Mundial da Saúde) considera que num futuro próximo a depressão será o principal fator de incapacidade e perda de anos com qualidade de vida.


Como mindfulness pode ajudar?

Os melhores estudos que temos atualmente sobre mindfulness se referem aos efeitos positivos da prática da atenção plena em pessoas com diagnóstico de depressão, em especial naquelas com quadros recorrentes, ou seja, que têm grande chance de terem novos episódios de depressão mesmo após o tratamento.

Nesse caso, os grupos de 8 semanas de mindfulness são os mais indicados, principalmente o programa MBCT (Mindfulness-Based Cognitive Therapy – Terapia Cognitiva Baseada em Mindfulness), que mistura as práticas de mindfulness com elementos da terapia comportamental e cognitiva, já consagrada no campo da psicologia e psiquiatria.

Com base nesses estudos científicos e na experiência clínica de mais de uma década, o Reino Unido incluiu o programa MBCT como opção terapêutica para a prevenção de recaída em quadros de depressão maior recorrente (mais de três episódios prévios) no sistema de saúde público, correspondente ao SUS no Brasil; e mindfulness hoje em dia é das políticas públicas para promoção do bem-estar da população inglesa, tendo sido ofertada inclusive aos parlamentares ingleses (correspondentes aos nossos deputados e senadores), sendo que mais de 140 desses parlamentares já passaram pelo treinamento em atenção plena.

As pessoas diagnosticadas com depressão, tanto com sintomas recentes e agudos, como em quadros crônicos de longo prazo, respondem bem ao treinamento de mindfulness, obtendo um efeito significativo na melhoria dos sintomas, mesmo entre pacientes com outras doenças crônicas como diabetes e hipertensão. Estudos mais recentes mostram que o MBCT é inclusive mais eficaz do que o tratamento com medicação antidepressiva para reduzir os sintomas depressivos e melhorar a qualidade de vida em pessoas com depressão recorrente (de repetição), sem aumentar o custo anual médio do tratamento.

Assim, as intervenções baseadas em mindfulness, em especial o programa MBCT, são recomendadas para tratar pessoas com transtorno depressivo atual, para evitar a recaída em quadros crônicos, sendo efetiva também em idosos.


Como funciona? De que maneira mindfulness pode ajudar pessoas com tristeza ou depressão?

Vejamos um exemplo banal, mas ilustrativo: imagine uma pessoa que cruza na rua com um conhecido que não vê há muito tempo e que, ao cumprimentá-lo, não recebe um cumprimento de volta, ou seja, o conhecido “passa reto” e segue seu caminho. Nessa situação é comum culpar a outra pessoa (rotular de “arrogante”, por exemplo), ou culpar a si mesmo (“o que fiz de errado na última vez que a encontrei” …). O fato real ou concreto poderia ser apenas que a pessoa estava desatenta, ou sem os óculos, ou que simplesmente não o reconheceu. O problema é que esse pensamento equivocado sobre a realidade (culpar o outro, ou se culpar), mesmo que de um fato banal, pode levar a ruminações (pensamentos repetitivos que geram preocupação e mal-estar) que duram horas ou mesmo dias, o que provoca cansaço mental, tristeza, culpa, e podem levar a quadros de depressão em pessoas mais vulneráveis.

Conforme já comentei em outros posts, o treinamento em mindfulness, mesmo que por técnicas simples como a prática de 3 minutos, desde que feita com regularidade, permite o desenvolvimento de “descentramento” (decentering). Essa capacidade possibilita que se vejam emoções e pensamentos não como “fatos” ou “realidades”, e sim apenas como “eventos mentais”. Assim, numa situação como a que citei anteriormente, a pessoa pode perceber o erro de avaliação, e prevenir o quadro de ruminação mental, prevenindo assim quadros mais graves como a depressão.


REFERÊNCIA:

Kuyken e colegas. Efficacy of Mindfulness-Based Cognitive Therapy in Prevention of Depressive Relapse: An Individual Patient Data Meta-analysis From Randomized Trials. JAMA Psychiatry. 2016 Jun 1;73(6):565-74.

PARA SABER MAIS SOBRE MINDFULNESS:

www.mindfulnessbrasil.com (Mente Aberta – Centro Brasileiro de Mindfulness e Promoção da Saúde – UNIFESP)

www.webmindfulness.com (WebMindfulness – Grupo de Pesquisa Coordenado pelo Prof. Javier García-Campayo – Universidad de Zaragoza, informações em espanhol)

www.goamra.org (American Mindfulness Research Association, Estados Unidos, informações em inglês)

www.umassmed.edu/cfm (Centro de Meditação “Mindfulness” na na Medicina, Universidade de Massachusetts, Estados Unidos, informações em inglês)

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